Não é de hoje que falar em marcas é sinônimo de falar em conteúdo que gere valor e que mostre quais as bandeiras que a empresa levanta, não é verdade?
Isso significa atrair quem acredita nos mesmos valores que ela e com isso consolidar essa relação.
Um case que diz muito sobre isso, e que precisamos entender é a campanha Dream Crazy da Nike.
E por que ela merece que você pare seus próximos minutos para ler este artigo?
Porque ela foi, para muitos especialistas, uma campanha controversa e vista, em um primeiro momento, como um “tiro no pé” da gigante de sportwear.
Entretanto acabou se mostrando uma estratégia fantástica que aproximou, fidelizou ainda mais os amantes e defensores da empresa e aumentou, dentre outras métricas, em mais de 1300% suas menções no Twitter em um único dia.
A Polêmica
Criada pela Wieden + Kennedy Portland para comemorar os 30 anos de “Just Do It”, a campanha Dream Crazy precisava significar um marco na história da marca, e podemos afirmar que, através de um manifesto de marca, ela soube como fazer isso.
Neste caso, a começar pela escolha do rosto da campanha: Colin Kaepernick. O ex-quaterback, que levou o San Francisco 49ers ao Superbowl de 2013, foi o narrador e principal personagem da campanha.
Mas não foi escolhido devido ao Super Bowl de 2013, mas pela polêmica que gerou 3 anos após perder essa competição.
Em meados de 2016, como forma de protesto às injustiças e brutalidades policiais que os jovens negros vinham sofrendo nos EUA, o jogador parou de se levantar, e depois começou a se ajoelhar nos campos, durante o hino nacional americano no começo dos jogos da Liga Nacional de Futebol (NFL).
Isso gerou um grande reboliço.
A parte conservadora – mais velha e branca, da sociedade – foi contra. O presidente Trump fez duras críticas ao protesto do atleta, chegando a dizer que não havia razão para ser feito.
Até a própria NFL condenou o ato, e aproveitou para avisar que os demais atletas seriam penalizados se fizessem o mesmo.
Como se não bastasse, o ano havia sido muito ruim para o São Francisco e para Kaepernick em termos de performance, então, em comum acordo, eles encerraram o contrato no fim da temporada de 2016.
Kaepernick permanece sem time desde então, mesmo com vários jogadores e especialistas como Pete Caroll, afirmando que ele é um atleta de nível titular, melhor, inclusive, que muitos quarterbacks contratados por milhões de dólares na temporada.
Mesmo assim, após a saída do jogador, a mensagem dele continuou reverberando nas quadras do futebol americano.
Em 2017, diversos times, jogadores e simpatizantes com a causa, começaram a se ajoelhar e a fazer atos ainda mais impactantes: Três times – Steelers, Titans e Seahawks – optaram por não sair dos vestiários durante o hino.
A essa altura, Kaepernick tornou-se um ícone!
Quando Green Bay Packers convocou sua torcida a participar do protesto, o objetivo do jogador havia sido concluído: estender à sociedade a missão de trazer a tona discussões que eram vistas com descaso.
A Campanha
No ano seguinte, já com a poeira mais baixa, foi a vez da Nike entrar em cena e trazer novamente a discussão a tona.
No dia 3 de Setembro de 2018, o próprio Kaepernick usou seu Twitter para iniciar a primeira parte da campanha Dream Crazy.
A foto, em preto e branco, supostamente faz referência ao processo que Kaepernick levantou contra a NFL, acusando a liga de conspirar para que o jogador se mantivesse fora das quadras desde que rompeu seu contrato com o São Francisco 49ers.
Em seguida, o caos se instaurou para a Nike. Hashtags como #JustBurnIt e #BoycottNike começaram a eclodir nas redes sociais.
Milhões de usuários estavam inconformados com o início da campanha.
E quem disse que a Nike se sentiu acuada? Nada disso!
Ela então lançou o ponto alto da campanha, o vídeo de Manifesto de Marca, não só estrelado, mas também narrado por Kaepernick.
O vídeo conta com a participação de diversos atletas patrocinados pela marca, dentre eles, Serena Willians, LeBron James e o skatista Nykan Huston.
Um dia depois, o boicote chegou ao seu ápice.
Consumidores de todo o país começaram a postar vídeos queimando e rasgando produtos da marca.
Suas ações chegaram a cair 3% na bolsa de valores e o fracasso da campanha era iminente.
Mas calma lá, pequeno Padawan!
Acredita mesmo que a Nike não havia previsto que a campanha polarizaria seus consumidores?
Óbvio que todo posicionamento tem seu risco e ele teve que ser levado em consideração. E foi.
Uma semana após a divulgação do vídeo, a Nike pode observar um aumento de 31% nas suas vendas online, de acordo com Edison Trends, enquanto no mesmo período do ano anterior foi de apenas 17%.
E aproveitando esse mesmo rebuliço, algumas semanas mais tarde, lançou junto com Colin um item exclusivo de edição limitada, uma Jersey vendida inicialmente a U$99,00 que se esgotou em suas primeiras horas.
E, caso você tenha se interessado em comprar, além do desafio de conseguir alguém que venda, para levar a camisa para casa terá que desembolsar no mínimo 250 trumps.
Agora você deve estar se perguntando:
Por que a Nike se propôs a esse risco e por que essa campanha é considerada um feito que rendeu à gigante prêmios como:
- Grand Prix de Outdoor, no Festival de Cannes Lions;
- Entertainment Lions for Sport, no mesmo festival;
- e o Outstanding Commercial, pela Creative Arts Emmy, prêmio esse que a empresa não ganhava desde 2002?
O Desfecho
Pois bem, entra aqui a importância de seguir seus valores e de fazer isso de maneira compatível com eles.
Como assim?
Explicamos!
Ao levantar a bandeira a favor dos movimentos de brutalidade policial e injustiça racial, a Nike fez com que as pessoas que concordassem com seu posicionamento quisessem cada vez mais reafirmar isso.
E a forma de fazê-lo foi adquirindo mais produtos da marca.
Ao escolher Kaepernick, fez com que o brilhantismo da campanha se tornasse ainda mais assertivo . Não é incomum vermos campanhas dando errado porque a estrela dela não faz o menor sentido de estar ali.
É como fazer uma campanha de bengalas e usar Usain Bolt para ser o garoto propaganda. Percebe como não passa credibilidade alguma?
Após esse vídeo, a marca veiculou alguns outros vídeos menores com os demais atletas da campanha nas grandes cidades do país.
“Então não pergunte se seus sonhos são loucos. Pergunte se eles são loucos o suficiente”, finalizou Kaepernick.